11 de janeiro -
Dia do Controle da Poluição por Agrotóxicos
Biocidas “matam vidas”
Precisamos nos certificar se a nossa ação é sustentável, isto é, se
não implica demolição dos suportes da Vida no planeta, e se está
orientada para a justiça social, se não pisa muita gente. Eu não
gostaria de ver a humanidade desaparecer, e dentro da humanidade eu
gostaria de ver mais equilíbrio. Eu não posso considerar progresso
aquilo que não prevê a manutenção da integridade da Vida e o aumento da
soma da felicidade humana. (LUTZENBERGER).
Aquilo que as indústrias transnacionais do setor dos venenos agrícolas e
o agronegócio chamam eufemisticamente de “defensivos agrícolas” são
nada menos do que armas químicas.
“O Brasil continua sendo o maior consumidor de venenos agrícolas do
mundo. Infelizmente, cada habitante consome hoje mais de cinco litros
por ano desses produtos. Se fosse consumido em um único dia, estávamos
todos mortos”. Cerca de 1 bilhão de litros são utilizados anualmente nas
lavouras brasileiras, o que representa mais de cinco litros de venenos
agrícolas por habitante ao ano. Muitos destes venenos como herbicidas,
fungicidas, inseticidas estão proibidos em quase todo mundo pelo risco
que representam à saúde pública. O perigo ameaça todos trabalhadores,
que manipulam os venenos, bem como todos os cidadãos que consomem os
produtos agrícolas.
“No Brasil o consumo de venenos agrícolas não é apenas em excesso, como
também existem os proibidos, os desconhecidos, o que pode indicar
contrabando”.
“Se já não obedeciam à antiga legislação, imaginem agora. Vivenciamos
pulverizações até nos quintais das residências, nos quintais das
escolas, nos passeios e vias públicas, nas periferias das cidades”.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que ocorram no mundo cerca
de três milhões de intoxicações agudas por agrotóxicos com 220 mil
mortes por ano. Dessas, cerca de 70% ocorrem em países do chamado
Terceiro Mundo. Além da intoxicação de trabalhadores que tem contato
direto ou indireto com esses produtos, a contaminação de alimentos tem
levado ao grande número de intoxicações, há mortes dos consumidores
mundiais e, muitas vezes, requisitos básicos de segurança para a
aplicação, armazenamento e a disposição final dos mesmos não são
cumpridos. Diante disso os serviços de informações toxicológicas
notificaram ao Ministério da Saúde 193 casos de intoxicação por
pesticidas agrícolas, domésticos e raticidas, em 1993.
Constitui-se esse, portanto, um grave problema de saúde pública,
demandando intervenção em diversas esferas, inclusive a implantação de
um sistema de vigilância da saúde de populações expostas a venenos
agrícolas.
Como não dispomos de dados que reflitam a realidade do número de
intoxicações e mortes por venenos agrícolas, porém é fácil supor que o
tamanho do problema não é pequeno, sendo um dos maiores.
Os biocidas são os principais poluentes do modelo agrícola industrial.
Por seu vasto espectro deletério, os venenos organossintéticos não se
limitam a um determinado local, apesar de serem aplicados numa área,
translocam-se por vários caminhos. A translocação das substâncias
tóxicas pode se realizar por meio biológico, pelos processos químicos e
físicos, através da atmosfera, do solo, das águas subterrâneas e
superficiais.
O uso de venenos agrícolas não pode ser entendido como um problema
exclusivamente do meio rural, pois a irradiação desses produtos tóxicos,
no meio urbano, é em decorrência do crescente uso nas lavouras, como
também, da expansão das áreas de cultivo e áreas urbanas, com sua
consequente aproximação de ambas. Por consequência disso, as substâncias
chegam muito facilmente à cidade, contidas nos alimentos, nas fontes de
água de abastecimento público, ou presentes no ar.
Algumas causas podem ser apontadas para explicar esse alto consumo de
biocidas, tais como: imediatismo financeiro, ignorância dos efeitos
tóxicos nos animais e no Homem e, mesmo, inconsequência.
Aos agricultores cabe ressaltar o papel de utilizador deste conjunto de
produtos e técnicas, muitas vezes sem a real noção do perigo que
enfrenta todos os dias. São também vítimas de um modelo que perpetua
dependência, no campo financeiro e econômico, pelos financiamentos, pela
necessidade de alta produtividade, pelos passivos sociais e ambientais
que cabem aos agricultores e a sociedade administrar.
A dimensão têmporo-espacial do uso de biocidas é muito mais complexa do
que parece, porque possui diversas interações que se ligam a aspectos
políticos, econômicos, sociais, culturais e ambientais. Para entender
esta detalhada trama é necessários outros trabalhos científicos que
possam aprofundar a compreensão num determinado seguimento e encaixá-los
no todo.
A contaminação humana e dos recursos naturais, pelo uso indevido e até
excessivo de biocidas, constitui grave problema de saúde pública,
podendo levar a intoxicações e óbitos dos seres humanos, causados pela
falta de conhecimentos, de cuidados preventivos e manejo agrícola
inadequado.
A realidade da aplicação indiscriminada dos venenos agrícolas no meio
agrícola. Apesar de a demanda por produtos mais saudáveis estar
crescendo, a população ainda está pouco informado sobre essas questões,
na medida em que o alimento de boa aparência causa impressão de ser mais
saudável.
Urge a necessidade de quebrarmos esse paradigma da aparência do
alimento, sob pena de o preço por esse consumo desenfreado e
insustentável ser altamente prejudicial para as atuais e futuras
gerações.
Os custos ambientais gerados pela utilização indiscriminada de veneos
agrícolas, ou seja, pela “política de alimento barato” ou “política do
alimento em massa”, podem ser caracterizados pela contaminação dos
corpos de água, do solo e do ar, pela perda da biodiversidade e de solos
agricultáveis por salinização, acidificação ou erosão e pela redução da
qualidade de vida da população.
Estudos muito bem fundamentados continuam comprovando o avanço dos casos
de câncer nas mais diversas faixas etárias, resultado do uso de
agroquímicos. Os números crescem, sobretudo entre agricultores e
populações rurais em localidades onde há um alto índice de aplicação dos
venenos.
No dia 21 de março de 2011, pesquisa denunciou a contaminação do leite
materno por agrotóxicos usados em plantações no município de Lucas do
Rio Verde, a 350 km de Cuiabá (MT). As amostras foram colhidas de 62
mulheres atendidas pelo programa de saúde da família do município. Em
100% das amostras foi encontrado pelo menos um tipo de veneno agrícola e
em 85% dos casos foram encontrados entre dois e seis tipos. A
substância com maior incidência é conhecida como DDE, um derivado de
outro veneno agrícola, DDT, proibido pelo Governo Federal em 1998 por
provocar infertilidade no homem e abortos espontâneos nas mulheres.
Sabemos que ao nos alimentarmos estamos nutrindo não apenas o nosso
corpo, mas também os sentidos, o espírito, a mente, a nossa alma. Ao
prepararmos nossa alimentação, com certeza são necessários vários
ingredientes, como história, cultura, poesia, amor, sentimento, que vão
muito além do sal e da pimenta.
A alimentação natural e ecológica faz parte da nova visão de mundo,
estabelecendo novas relações, dando à vida o seu significado verdadeiro,
que é a própria natureza e a alimentação.
Vivemos a cultura de supermercado, onde tudo está a nossa disposição.
Consumimos alimentos industrializados e frutas que não são da época,
produzidas de maneira forçada, com grande quantidade de insumos químicos
e venenos agrícolas.
Hipócrates, dizia “somos o que comemos”. Nosso corpo não deixa de ser
uma máquina, muito delicada por sinal, e para funcionar precisa de um
bom combustível. Que tipo de alimento está consumindo? Quais as doenças
que estamos desenvolvendo?
A ética como tônica no combate aos venenos agrícolas
Mas comida sustentável, além da saúde, estamos tratando de outros
diversos temas relacionados à cozinha, como o cuidado com o meio
ambiente, o compromisso com a produção local e regional, a consciência
ecológica, o consumo de hortaliças e frutas da época e ecológicos. Assim
o sistema alimentar ideal seria semelhante ao de nossos avós e bisavós,
quanto mais natural melhor, o nosso cardápio diário deveria ser
composto de pelo menos 60% de alimentos crus e 40% de alimentos cozidos.
Que tipo de influência e impacto tem sobre o ambiente em que vivemos o
alimento que nós consumimos? Como ele é preparado? Como ele é produzido?
Internamente, no corpo, o alimento tem uma influência direta nas
células vivas, que vivem em perfeita harmonia, quando permitimos;
externamente é a nossa casa, o bairro, a cidade, o planeta. Por isso
qualquer mudança alimentar que seja feita, dando a devida atenção no que
estamos ingerindo, irá trazer muitos benefícios, assim ao cuidar de
você, da sua alimentação, automaticamente, estará cuidando do planeta.
Independente de sermos consumidores ou agricultores, todos precisamos de
sistemas produtivos sustentáveis, valorizando a sabedoria e as culturas
locais, em especial os hábitos alimentares, garantindo a segurança
alimentar, gerando renda e um novo olhar sobre o sistema de produção e a
vida.
O agronegócio, as transnacionais, as monoculturas, a degradação
ambiental em função da busca incessante pelo lucro e pelo acúmulo de
riquezas, a prioridade dada às exportações em detrimento da alimentação
do povo brasileiro, os transgênicos e o latifúndio, todas essas ameaças e
fatores têm avançado bastante na sociedade brasileira nos últimos anos.
Leonardo Boff, na sua sabedoria, nos adverte: “ocorre que a Terra não
aguenta mais este tipo de guerra total contra ela. Ela precisa de um ano
e meio para repor o que lhe arrancamos durante um ano. O aquecimento
global é a febre que denuncia estar doente e gravemente doente”.
São evidentes os sinais da insustentabilidade ecológica do modelo
civilizacional pautado no domínio da natureza pelo homem, e sejam
adotadas diversas medidas de ordem política e jurídica no intuito de
promover uma adequação do exercício das liberdades humanas aos limites
da natureza sem prejudicar a continuidade do processo vital, os
resultados têm sido pífios.
A insustentabilidade está posta, traduz-se na monocultura da mente que a
humanidade vem eficientemente estabelecendo nos últimos séculos.
Trata-se do limite intransponível do que se compreende por humano.
A ética acompanha o homem desde os primórdios da civilização, e vem
moldando-se com a história da humanidade. Conceber, racional e
emocionalmente, finalidades para o agir humanas, a partir de um quadro
de incerteza e de uma crise ambiental sem precedentes, que expõe as
fragilidades do conhecimento humano e de sua capacidade de interagir
ecologicamente, é um desafio que compete à economia, à sociologia, ao
direito, mas, sobretudo, à ética.
A ética promove uma reflexão sobre a escolha dos valores da sociedade. É
a partir dos valores exsurgentes com a crise ecológica que vive a
sociedade de risco, que os danos próprios dessa sociedade, como os danos
ambientais, podem vir a serem evitados. Valores como dignidade,
justiça, democracia, são valores cujos fundamentos a nova ética deve
conformar. Que justiça é pertinente à sociedade pós-moderna, ela implica
pensar no futuro? Que compromisso essa compreensão de justiça coloca
para os homens do nosso tempo? Reflexões dessa ordem servirão para
nortear o futuro da humanidade e, eventualmente, afastá-la das
contundentes ameaças que a acompanham neste século. A ética ecológica é,
sobretudo, e independentemente das concepções antropocêntricas ou
biocêntricas, a ética que tem por finalidade a preservação da Vida.
A ética se relaciona com os venenos agrícolas na medida em que o uso
destes gera uma série de implicações nos seres humanos e na natureza. Os
venenos agrícolas liberados no ambiente podem causar uma larga escala
de efeitos ecológicos e na saúde humana. Vários são carcinógenos
comprovados ou suspeitos e podem ter efeitos tóxicos em seres humanos e
em espécies aquáticas. Os efeitos na saúde provocados pela exposição
crônica, em longo prazo ou a nível baixo de concentrações traço dos
agrotóxicos são desconhecidos. Outros interesses incluem efeitos
sinergísticos de agrotóxicos múltiplos e também os processos de
bioacumulação, bioconcentração e biomagnificação que envolvem a
acumulação de substâncias químicas por organismos através da cadeia
alimentar.
A responsabilidade ética para com as gerações presentes e futuras, com a
qualidade de vida que só se concretiza com a preservação do equilíbrio
ecológico, é o cerne da ética. A ética da responsabilidade compreende a
cumulatividade das ações humanas e tem a preocupação em resguardar a
humanidade dos efeitos cumulativos da tecnologia. Sua proposta requer
ação coletiva e tem um apelo a uma cidadania planetária, na medida em
que deve estar presente na prática cotidiana de cada indivíduo e nas
políticas públicas promovidas pelo Estado, bem como na das organizações
supranacionais.
Toda essa mudança de paradigma permite que a humanidade deixe de ser
compreendida como portadora de uma condição especialmente deslocada e
superior à natureza. Ao contrário, passa a integrá-la e a tornar-se
responsável por mantê-la viva, porque dessa nova ótica é possível
entender que o homem está irmanado a ela e que a sua própria existência e
a de seus descendentes são interdependentes.
É por meio do conhecimento ecologicamente pertinente, da ética
consequente e da recuperação do político, que em meio à aparente
desconstrução, podem surgir novos sentidos, que não se confundem com as
antigas verdades, mas estimulam a solidariedade e a responsabilidade
pela Vida.
Infelizmente não há meio termo nesse setor. É impossível garantir a
qualidade, a segurança e o volume da produção de alimentos dentro desse
modelo degradante. Não há como incentivar o uso correto de venenos
agrícolas. Isso não é viável em um país tropical como o Brasil, em que o
calor faz roupas e equipamentos de segurança, necessários para as
aplicações, virarem uma tortura para os trabalhadores.
A ética ecológica ou ambiental está longe de ser estéril, perdida nas
nuvens, metafísico; pelo contrário, ela destina-se a tirar conclusões
práticas como a criação de políticas de proteção ao meio ambiente, de
solução do conflito entre o homem e a natureza; não é fácil que o homem
aceite que a natureza também tem valor intrínseco e que esse já não é um
privilégio a ele reservado.
Há que buscar solução na transição agroecológica, ou seja, na gradual e
crescente mudança do sistema atual para um novo modelo baseado no
cultivo orgânico, mantendo o equilíbrio do solo e a biodiversidade,
redistribuindo a terra em propriedades menores.
Assim facilita a rotatividade e o consórcio de culturas, o controle
natural às pragas e o resgate das relações entre os seres humanos e a
natureza, valorizando o clima e as espécies locais.
Existem muitas experiências bem sucedidas no mundo e no Brasil, que
comprovam a viabilidade desse modelo. Até em assentamentos da reforma
agrária há exemplos de como promover a qualidade de vida, a justiça
social e o desenvolvimento sustentável.
“A agroecologia não é apenas um sistema de produção agrícola, mas também
um ato político contra a agricultura predatória e contra as condições
de trabalho injustas para o agricultor. Além disso, ajuda na melhoria da
qualidade de vida, permitindo tanto ao agricultor quanto ao consumidor
não terem contato com agroquímicos. Enfim, mais que uma série de
práticas, a agroecologia é uma filosofia de vida”.
A lógica de combater às pragas, insetos, ervas daninhas, pestes implica
no principio de que se há de matar o inimigo e, por isso, inseticidas,
herbicidas, pesticidas, praguicidas entre outros venenos agrícolas
matam, não só o inimigo, mas, também, pessoas, plantas, peixes e outros
animais.
A educação agroambiental deve ser uma forma de “regenerar” a mão de obra
do campo, tanto no que diz respeito aos efeitos negativos da
escravidão, quanto ao desejo de autonomia gerado pela imensa fronteira
agrícola. Por isso mesmo, à medida que a campanha abolicionista avança,
vão surgindo propostas de ensino agrícola.
A questão é a maneira de viver daqui em diante sobre o planeta, no
contexto da aceleração das mutações técnico-científicas e do
considerável crescimento demográfico. Em função do contínuo
desenvolvimento do trabalho maquínico, redobrado pela revolução
informática, as forças produtivas vão tornar disponível uma quantidade
cada vez maior do tempo de atividade humana potencial. Mas com que
finalidade? A do desemprego, da marginalidade opressiva, da solidão, da
ociosidade, da angústia, da neurose, ou da cultura, da criação, da
pesquisa, da reinvenção do meio ambiente, do enriquecimento dos modos de
vida e de sensibilidade?
Finalmente, devemos lembrar que, antigamente, a Agroecologia era uma
prática sagrada. Era ligada ao culto da natureza, vista como divina.
Hoje, redescobrimos na Terra, na Água e em todo ser vivo, um sinal da
presença do mistério amoroso que envolve o universo. O amor que faz do
universo uma comunidade de vida. Que se denomine Deus ou não, esta
energia amorosa nos chama a cada um de nós a sermos nós mesmos sementes e
mudas fecundas desta amorização do planeta. Cada vez mais as pessoas
que seguem algum caminho religioso sabem que a religião só vale a pena
se ajudar a humanidade a viver este processo de amorização.
“O grande problema do setor é realmente o déficit de informações, as
quais precisam chegar à população, principalmente a quem manipula esses
venenos agrícolas”.
Assim não podemos continuar a envenenar cada vez mais o nosso belo
Planeta e a nós mesmos. Devemos repudiar a flexibilização no sistema de
saúde e meio ambiente no processo de avaliação e autorização de venenos
agrícolas.
Texto recebido de Julio Cesar Rech Anhaia - Engº Agrº - Alegrete – RS - 11/01/2014